Apesar do avanço da renda da classe C nos últimos anos e do crescente acesso
ao mercado de consumo e crédito, um fosso ainda separava os moradores de favelas
e de outras áreas das cidades do país em 2010, de acordo com dados do Censo do
IBGE divulgados nesta quarta-feira (6).
Eles tinham rendimento mais baixo, nível de instrução menor e estavam mais
sujeitos à informalidade no mercado e trabalho. Em suas casas, alguns bens como
computador com internet e automóvel também eram menos presentes.
Talvez resida na educação o maior abismo: enquanto 14,7% da população de
outras áreas tinha concluído o ensino superior, nos chamados aglomerados
subnormais (favelas, palafitas, cortiços e outros tipos de conjuntos de
habitações precárias) esse percentual era de apenas 1,6%.
Na renda, a disparidade também ficava evidente: 31,6% dos moradores de
comunidades carentes tinham rendimento familiar per capital menor do que meio
salário mínimo, contra 13,8% da população de outras áreas. A informalidade
também era mais elevada: 27,8% dos moradores de favelas trabalhavam sem carteira
assinada. O percentual fica restrito a 20,5% dos ocupados que moraram fora
dessas áreas degradadas.
De acordo com o IBGE, 11,4 milhões de pessoas viviam em favelas em todo o
Brasil em 2010. Eram 6.329 comunidades, distribuídas em 232 cidades brasileiras.
Trata-se ainda, segundo o instituto, de um fenômeno é tipicamente metropolitano.
As cinco maiores regiões regiões metropolitanas brasileiras concentravam 59,3%
dos moradores de favelas de todo o país. Desse total, 18,9% viviam na
Grande
São Paulo e 14,9% no Rio de Janeiro e nas cidades do seu entorno
metropolitano. As demais regiões na lista das cinco eram Belém, Salvador e
Recife
Segundo Maria Amélia Villanova, técnica do IBGE, a ocupação de favelas é um
processo histórico no país e se deu de modo diferente nas diversas regiões
brasileiras, mas sempre caracterizado pela presença de população mais pobre e em
moradias sem as mesmas condições de outras áreas, com acesso mais difícil, sem
infraestrutura adequada em muitas localidades e, em geral, sem posse irregular
do terreno ou imóvel.
Porém, diz, existem algumas diferenças regiões no tipo de ocupação do solo.
Em São Paulo, por exemplo, as favelas predominam na periferia. Já no Rio, as
comunidades mais antigas se formaram nas regiões central, na zona sul e da zona
norte (especialmente na área mais perto do centro, como Estácio e Tijuca) em
morros e encostas.
Os dados mostram ainda que em 72,6% dos domicílios em favelas não tinham
espaçamento entre si, formando um grande bloco de casas ou pequenos edifícios.
Em 64% das mordias, havia apenas um pavimento construído. "Os aglomerados
subnormais tendem a ser mais densamente ocupados do que o resto das cidades",
disse Maria Amélia Villanova, técnica do IBGE.
Na capital paulista, a densidade demográfica em favelas era de 297 habitantes
por hectare (cada hectare equivale a 10 mil metros quadrados). Nas favelas do
Rio, por exemplo, a densidade era menor: 257 habitantes por hectare.
Em todo o país, a maior parte das favelas está em área plana (52,5%), embora
19,7% das comunidades se situavam em encostas bastante inclinadas - um dado que
em quase toda a temporada de chuvas de verão se traduz em deslizamentos de casas
e frequentemente em mortes. A região Sudeste concentrava a maioria das favelas -
55,5% das 6,3 mil comunidades instaladas no país.
Rute Imanishi, pesquisadora do Ipea especializada no tema, disse que "a opção
de morar nas favelas foi a que restou" às famílias de renda mais baixa que
queriam ter acesso a serviços públicos de melhor qualidade (saúde e educação em
especial) e morar mais perto do trabalho diante do elevado custo de moradia nas
maiores capitais do país.
"É muito caro morar em cidades como Rio e São Paulo. A alternativa barata
seria viver muito mais longe, mas cidades nas "franjas" dessas regiões
metropolitanas, em cidades muito afastadas e com serviços igualmente ou até mais
precários do que nas favelas."
Além disso, afirma, muitos moradores criam cômodos para alugar e geram uma
renda extra morando em favelas. Permitem ainda que filhos e outros parentes
construam "na laje" ou no mesmo terreno. Se não estivessem em comunidades, não
seria tão fácil construir e "verticalizar" suas moradias em áreas regulares sob
fiscalização das prefeituras.